terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Produtores temem êxodo rural após reforma da Previdência

Sem ter mais condições de cuidar sozinhos de um pomar de 4,5 mil pés de laranja, Guilherme Barcella, de 68 anos, e Mélia Luiza Barcella, de 67, terceirizaram a atividade desde o ano passado. Pouco tempo antes, tinham abandonado a produção leiteira. Com um extenso “currículo” na agricultura, com o cultivo de feijão, fumo, soja e milho, o casal conta que a vida foi “muito sofrida” no interior de Canudos do Vale. Foi por isso que as três filhas quiseram tomar um caminho diferente. Deixaram a propriedade para fazer um curso superior e exercer uma profissão diferente da dos pais.

As três formaram-se em Enfermagem. Duas trabalham em Montenegro e outra em Canudos do Vale. Próxima dos pais, Marisa Barcella, 44 anos, acompanha de perto o êxodo rural dos jovens e a saúde dos trabalhadores que procuram os serviços do posto onde trabalha. “O trabalho agrícola é muito pesado. Se as mulheres tiverem que trabalhar pesado até os 65 anos para se aposentar, vão ser muito prejudicadas. Por mais que a mecanização das propriedades tenha facilitado bastante o trabalho nos últimos anos, isso tem um custo alto que muitos não podem acessar”, acredita.

Quando estava em idade escolar, Marisa ouvia dos seus pais a recomendação para que se empenhasse nos estudos, de modo a não precisar trabalhar de “sol a sol”. “Começamos a lidar na roça quando mal conseguíamos puxar o cabo da enxada”, conta a mãe, Mélia, que acredita que nenhuma filha voltaria à propriedade. Marisa pensa que a mãe está certa. “Minhas irmãs e eu fomos trabalhar de empregadas domésticas para fazer a faculdade. Hoje, dificilmente voltaríamos a buscar a subsistência na roça. Assim, eu vejo que a maioria dos jovens saem para não voltar, por mais que, na cidade, as coisas não vão bem”, avalia a enfermeira.


O êxodo rural e o problema de sucessão familiar deverá se agravar após reforma da Previdência, na opinião de entidades como a Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Fetraf/Sul). A coordenadora estadual Cleonice Back diz que os jovens tendem a ficar ainda mais desestimulados a permanecer no campo. Para o presidente do STR de Lajeado, Lauro Baum, apenas garantias de renda têm segurado os mais novos no meio rural. “A palavra mágica é renda. O que ainda vai restar para o jovem ter uma motivação, uma consciência, se a coisa piorar?”, questiona.

Acompanhando toda a balbúrdia em torno do tema, o prefeito de Canudos do Vale, Luiz Alberto Reginatto, diz que tem esperança que a bancada ruralista do Congresso Nacional tenha bom senso ao avaliar as propostas. Reginatto diz que tem feito contato com deputados para enfatizar os prejuízos que na sua avaliação serão causados ao meio rural. “O trabalho na agricultura é árduo. A gente nota a diferença daquele que trabalha debaixo de um teto e daquele que tem seu ‘escritório’ a céu aberto. A culpa não é do agricultor”, defende.



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