sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

No Brasil, o combate é mais difícil

Se as moscas-das-frutas têm tirado o sono dos fruticultores brasileiros, a escassez de produtos para o combate às pragas assusta ainda mais. Atualmente, existe no Brasil um movimento de proibição de produtos químicos comprovadamente eficientes, mesmo sem substitutos aprovados para uso no País, fato que tem levado uma sensação de insegurança ao campo. Para os especialistas, a questão é muito mais ideológica do que científica e pode até colocar em risco a produção brasileira de frutas. O movimento foi “importado” da Europa, meca dos ambientalistas, onde o agronegócio sobrevive graças aos polpudos subsídios dados por governos para que os produtores rurais se mantenham na atividade.

Por lá, muitos defensivos já foram retirados do mercado sob o argumento de serem nocivos aos humanos e ao meio ambiente. Há alguns anos, a Europa baniu o uso dos inseticidas organofosforados, amplamente utilizados desde os anos 1960 e até hoje um dos mais eficazes no combate às moscas em todo o mundo. No Brasil, são usados inclusive no controle de pragas urbanas, como o Aedes aegypti. Os fosforados têm uma característica que o torna necessário em alguns casos: eles são os únicos defensivos que combatem as larvas dentro dos frutos - caso da mosca-da-carambola. Mesmo assim, influenciadas pelos europeus, as autoridades brasileiras decidiram proibir a utilização de vários produtos fosforados na fruticultura.

“Em países como Dinamarca, Finlândia e Suécia, a utilização desse grupo químico muitas vezes é desnecessária, pois a área cultivada é reduzida, o inverno é rigoroso e as lavouras estão livres de pragas importantes como as moscas-das-frutas”, afirma Marcos Botton, pesquisador da Embrapa Uva e Vinho. “Eles são usados no restante do mundo com sucesso e são fundamentais em estratégias de manejo da resistência”, explica. As regras para uso desses produtos também são confusas no Brasil. Existem hoje substâncias proibidas para uso na agricultura, como triclorfom e fenthion, que são autorizadas para uso animal, dificultando a compreensão dos critérios que levam ao banimento de determinados produtos.

Outra dificuldade é a falta de registro de agroquímicos para algumas culturas de menor escala, conhecidas como “minor crops”, o que torna o combate às pragas muitas vezes uma atividade ilegal. No mundo todo, os registros dos agrotóxicos são feitos por pragas. Assim, um determinado inseticida pode combater uma espécie invasora onde quer que ela esteja. No Brasil, no entanto, o registro precisa ser feito por cultura, ou seja, o agricultor só poderá combater o inseto se ele estiver em uma cultura registrada para o produto. Se o inseto migra para uma lavoura vizinha, a 50 metros de distância, e passa a atacar uma outra cultura não registrada, o combate torna-se irregular. 

Um exemplo prático vem da região Sul do Brasil, onde existem milhares de agricultores que cultivam frutas como ameixa, citrus, maçã e pêssegos, muitas vezes numa mesma propriedade ou próximas entre si. O dimetoato e o methidathion são inseticidas do grupo químico dos organofosforados, autorizados para o controle de pragas em citrus e maçãs. “Mas se um desses inseticidas for empregado para o controle de uma praga em ameixa ou no pessegueiro, o produtor estará na ilegalidade, mesmo que a quantidade de resíduo detectada nos frutos não apresente risco à saúde. Trata-se de um problema regulatório que precisa ser resolvido”, afirma Botton.

O aumento da incidência de moscas-das-frutas no País pode estar relacionada à retirada de defensivos comprovadamente eficientes do mercado. Além de mais caros, os novos produtos não apresentam a mesma eficácia. O banimento de produtos sem substitutos já se mostrou um problema para o Brasil em outras ocasiões. O caso mais recente é emblemático. Proibido em 2013, o inseticida endosulfan era a principal arma no combate à broca-do-café, praga que ataca os cafezais brasileiros desde o início do século XX. Sem um controle efetivo, os invasores se multiplicaram rapidamente e passaram a causar prejuízos aos produtores. No início de 2015, menos de dois anos após a proibição, o Ministério da Agricultura declarou estado de emergência fitossanitária nos estados de Minas Gerais, São Paulo e Espírito Santo, principais polos de produção de café do País, devido ao “risco de iminente” de infestação das lavouras cafeeiras pela broca.

Assim como no caso do café, a retirada dos inseticidas organofosforados do mercado brasileiro pode trazer grandes dificuldades no combate à mosca-da-carambola. “A retirada é preocupante em termos de erradicação, pois esses são atualmente os produtos com maior potencial contra os insetos”, afirma Cristiane de Jesus Barros, da Embrapa Amapá. De acordo com a pesquisadora, outros produtos têm sido testados, porém, sem a mesma eficácia. A guerra do Brasil contra as moscas continua. O problema, agora, é que teremos cada vez menos armas para nos defender.

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