A influência da mudança do clima na produção agropecuária foi discutida durante Fórum, em 10 de agosto, na Embrapa Meio Ambiente (Jaguariúna, SP). O objetivo foi analisar criticamente se ocorrem alterações que justifiquem preocupações e permitam correlacionar eventos extremos com suposições atreladas à instabilidade produtiva das lavouras brasileiras.
O chefe geral da unidade Marcelo Morandi destacou, na abertura do evento, a importância do fórum, que começou com discussões internas, pela necessidade de analisar, entender e se preparar para essas mudanças. "É um tema preocupante para todos os segmentos e esse encontro com pessoas altamente qualificadas é o primeiro passo para atender essas demandas tão necessárias e urgentes no pais".
O pesquisador Eduardo Assad da Embrapa Informática Agropecuária, mediador do fórum, falou sobre os rumos do aquecimento global e os limites da adaptação. Para ele, não é possível mais apenas sentar e discutir, assim como não há como abordar essa questão sobre apenas um ângulo. "O planeta não está ameaçado. Nós é que estamos, a humanidade. A fase de discussão passou, cabe agora buscar soluções".
A primeira palestra, com Lincoln Muniz Alves, do Centro de Ciência do Sistema Terrestre (CCST/Inpe), abordou as razões para o aumento das oscilações climáticas em nível nacional. Para ele, o Brasil precisa reavaliar sua vulnerabilidade e exposição para gerenciar melhor o risco de desastres. Essa reavaliação precisa ser plenamente integrada no processo de planejamento.
Logo após, Santiago Cuadra, da Embrapa Informática Agropecuária, falou sobre as perspectivas para cenários de mudanças de temperatura e precipitação: incertezas inerentes às projeções climáticas. Conforme Cuadra, ao longo das décadas, os modelos numéricos foram ficando mais complexos, integrando todos os processos envolvidos. Para ele, é importante usar não apenas um modelo. "A variabilidade é grande e o sistema atmosférico é dinâmico".
Em seguida, Caio dos Santos Coelho, do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC-Inpe) discutiu a recente seca na região Sudeste do Brasil, com a apresentação de um estudo sobre a viabilidade de previsão do início da estação chuvosa no estado de São Paulo. Ele abordou a crise de água, impactos no abastecimento humano, agricultura e geração de energia elétrica. Conforme Caio, esse foi um evento extremo, com período de retorno de 20 anos. Conforme seus estudos, o aumento da população e do consumo de água foram os principais fatores para a crise hídrica. Para Assad, mediador do Fórum, a falta de proteção dos mananciais e das nascentes com mata ciliar e o manejo de solo também contribui para esse déficit no abastecimento.
Na segunda parte, Paulo Sentelhas, da Esalq, abordou a variabilidade de mudanças climáticas e seus impactos na produtividade agrícola. De forma genérica, os principais fatores que causam impactos na produção agrícola são: clima (50%), solo (23%), planta (13%) e manejo (14%). De acordo com ele, a variabilidade climática é parte intrínseca do clima de um local e deve ser avaliada sempre que se objetiva caracterizar um ambiente de produção agrícola. "Temos cenários e não certezas. Precisamos nos preparar para eles, melhorando o que podemos, preparação do solo, melhoramento genético".
Em seguida, Joaquim de Souza Ferreira Filho, também da Esalq, apresentou simulação da perda econômica da agricultura brasileira em função das variações climáticas. Ele trabalha com modelos computáveis de equilíbrio geral (CEG), que são equivalentes aos modelos climáticos globais. Conforme o professor, haverá uma migração de retorno nordeste para sudeste, com queda acentuada de salários. "As regiões mais pobres seriam mais severamente afetadas pelo cenário simulado, com efeitos mais graves em algumas regiões específicas. Na agricultura, os impactos sobre a economia brasileira não serão muito grandes".
Edson Oliveira Vendruscolo, do Grupo El Tejar discorreu sobre as adequações empresariais para convívio com a variabilidade climática em áreas de produção de grãos. O Grupo El Tejar tem sede no Mato Grosso e seu foco é produção de grãos com custos controlados. "Nosso planejamento começa um ano antes do plantio e, como não podemos mudar o clima, nossa principal ferramenta de gestão está muito atrelada às ações de controle das operações agrícolas, visando ajustar a hora certa para a execução. Há 15 anos, a produtividade de soja no Mato Grosso está estagnada, por uma série de razões, o que aumenta o tamanho do nosso desafio".
E Verona Montone, representante da The Climate Corporation, abordou as ações da empresa rumo à agricultura digital, visando ajustes gerenciais de grande porte para convívio com cenários de incertezas, através do uso de ferramentas digitais, capazes de auxiliar o empresário rural no planejamento agrícola e tomada de decisões.
Na terceira parte do Fórum, foram discutidas as formas de minimização dos danos e as alternativas agrícolas para o convívio com o novo cenário nacional. O uso da tecnologia de adubação biológica para melhoria da interface solo-planta em condições adversas de cultivo foi demonstrado por Solismar Venzke Filho, consultor de P&D da empresa Microgeo. Conforme o consultor, o uso da tecnologia proposta pela empresa permite aumento da microporosidade e da troca de gases no solo, permitindo maior enraizamento das plantas, resultando em maior produtividade.
Alexandre Heinemann, da Embrapa Arroz e Feijão, apresentou a caracterização ambiental como ferramenta para a manutenção da produtividade agrícola em cenários de mudanças climáticas, através de um estudo de caso para feijão. Para o pesquisador, é necessário classificar a região de produção para subsidiar os programas de melhoramento vegetal com informações seguras, buscando compreender como as culturas respondem às variações espaço-tempo, solo, clima e manejo. Ainda, conforme o pesquisador, a escolha da época de plantio é essencial para convívio com cenários de mudanças climáticas.
As tecnologias biológicas para a proteção das plantas cultivadas aos eventos de seca foram abordadas pelo pesquisador Itamar Melo, da Embrapa Meio Ambiente, que expôs a importância do uso de ativos biológicos na agricultura, demonstrando o imenso potencial de contribuição dos microrganismos em sua interação com as plantas cultivadas, auxiliando a agricultura brasileira no convívio com cenários de mudanças do clima.
Alexandre Nepomuceno, da Embrapa Soja, abordou sobre as estratégias para aumento da eficiência e sustentabilidade da produção de soja em condições climáticas adversas. Conforme Alexandre, "não temos plantas resistentes à seca, então, tentamos reduzir as perdas agrícolas com o uso de genótipos mais tolerantes, associados a estratégias de manejo mais eficientes".
As estratégias para o aumento da eficiência e sustentabilidade da produção de cana-de-açúcar, em condições climáticas adversas foram demonstradas por Hugo Molinari da Embrapa Agroenergia. "Em função da ocorrência de várias safras com quedas expressivas de produção de cana devido ao déficit hídrico, pensou-se no melhoramento genético como uma das estratégias de mitigação". O pesquisador destacou a necessidade de adaptação do setor frente às mudanças climáticas, através do desenvolvimento de variedades comerciais resistentes a seca – GM ou não.
O tema pecuária também foi abordado no tocante aos impactos das mudanças do clima na produção de gado de corte: desafios e alternativas, pela pesquisadora Lucimara Chiari, da Embrapa Gado de Corte. O Brasil possui o maior rebanho comercial de bovinos do mundo, sendo que a cada 3 bifes comidos, 1 vem do Brasil. Sabe-se hoje que a elevação da temperatura em 3ºC pode promover perdas de até 25% da capacidade de pastoreio.
Além disso, essa variação na temperatura influencia no ciclo de vida e na capacidade de desenvolvimento de parasitas importantes. "Maior temperatura, mais moscas e carrapatos. Houve surtos de mosca dos estábulos em períodos não esperados", diz a pesquisadora. E espécies que não causam problemas hoje, podem se tornar um grande entrave para a produção de carne, já que podem suportar temperaturas extremas e não há ainda estratégias de controle.
Uma das alternativas já existentes para mitigar esses efeitos é o ILPF, enfatiza a pesquisadora, já que melhora o bem estar animal. "Sistemas integrados proporcionam várias vantagens, como sequestro de carbono, diversificação, melhoria na qualidade da forragem e ciclagem de nutrientes.
O conceito Carne carbono Neutro, marca registrada da Embrapa, produz carne nesse sistema, onde as emissões de gases de efeito estufa são neutralizadas.
Já as iniciativas para o estímulo à inovação foram apresentadas por Renato Luzzardi, da Bayer, que, por sua vez, criou há alguns anos um setor dentro da empresa apenas para reunir e gerenciar novas ideias a partir da interface com a comunidade científica brasileira.
Fonte: Embrapa
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