No Brasil, faltam armazéns para guardar a produção de grãos que cresce ano após ano. Segundo a Confederação Nacional da Agricultura, há um déficit de 30% entre o que é produzido no país e o que produtores conseguem guardar de forma adequada.
Também são poucos os armazéns nas fazendas. Nos Estados unidos, por exemplo, mais da metade da safra fica no campo. Já no Brasil, não passa de 15%. Mas essa situação está começando a mudar. Agricultores do Paraná investem na construção de armazéns coletivos.
A colhedeira faz parte do cenário em época de safra no Paraná. Há máquinas trabalhando por todos os canto. O serviço começa cedo na fazenda da família Pelanda, no município de Palotina.
O agricultor Domingos Pelanda e os filhos João e Guilherme correm para colher os 550 hectares plantados com soja. Ele contou que os últimos anos têm sido muito bons para a agricultura, o que permitiu que a família comprasse máquinas novas e instalasse dois pivôs centrais para irrigação. Na propriedade já são 180 hectares, que fazem muita diferença em anos de abaixo da média. “Eu até fico admirado de tá plantando com um tempo seco assim”, diz o seu Domingos.
Em 40 anos de lida na agricultura, seu Domingos tem muitos motivos para se admirar. Ele começou a plantar soja no final da década de 1960. "Eu produzia cerca de 40 sacos por hectares. Hoje, colho 80 sacos por hectare", compara.
Hoje, o Paraná é o segundo maior produtor de soja do Brasil. A área plantada com a cultura cresceu 30% em dez anos. O número que mais impressiona é o do aumento da produtividade das lavouras. Em 2004, eram colhidos uma média de 2,3 mil quilos de soja por hectare. Na última safra, esse número passou dos 2,9 mil quilos. Houve aumento de 600 quilos de soja por hectare. Com isso, a produção total do estado do Paraná aumentou em quase 8 milhões de toneladas em uma década.
A alta produtividade aliada a bons preços também mudou a forma como o agricultor comercializa a safra. "A gente veio se capitalizando. Entã, você consegue vender uma parte, pagar as despesas, e outra parte voc esperar um melhor momento para comercializar", diz Guilherme Pelanda.
Em cima da palhada da soja, os agricultores semeiam o milho, lavoura que também tem dado ótimas produtividades na região. São mais de 120 sacas por hectare. O resultado é a falta de espaço para guardar tantos grãos. As cooperativas e cerealistas da região estão ampliando instalações, mas a armazenagem tem custo para o produtor: "Você entregando para uma cooperativa, ele retém 1% da produção na entrega", explica André Pelanda.
"Uma vez entregue lá dentro, a empresa passa a ser o dono daquele produto. Ela negocia da forma que quiser e você vai negociar dentro do preço que ela te oferece, que é o mercado regional assim aqui", esclarece o agricultor Antônio Galli.
Os agricultores também se queixam do destino da chamada sobra, que são os grãos fora do padrão de qualidade exigido pelo mercado. "Vamos falar de milho safrinha. A gente tem na nossa região muita geada e acaba dando problema de grãos avariados. Se fosse entregar numa empresa, seria descontado. Por exemplo, entrega uma carga com 8% de grãos avariados, o tolerado é 6, esses 2% a empresa descontaria de mim e eu não veria mais", completa Galli.
A diferença de 2% fica para as empresas, que depois misturam esse produto com grãos perfeitos e vão fazendo lotes dentro do padrão de qualidade. Mas o dinheiro da sobra não volta para o agricultor. Só se livra do problema quem tem armazém próprio.
Então, surgiu a ideia de formar grupos de agricultores para a construção de estruturas para receber e armazenar os grãos em uma espécie de condomínio. O Agro5000, primeiro condomínio formado em Palotina, pertence a 14 sócios. O condomínio começou a funcionar há nove anos com capacidade para armazenar nove mil toneladas de grãos. O lugar passou pela primeira ampliação, que elevou a capacidade para 16 mil toneladas. Agora, o espaço está novamente em obra. Na próxima safrinha, o armazém irá conseguir guardar 25 mil toneladas de grãos.
Além de receber os grãos, no condomínio o produto fica no padrão exigido pelo mercado. “A gente faz a classificação de todo produto. A partir daí, é beneficiado o produto e colocado dentro de cada silo. Para depois embarcar para exportação ou diretamente para o consumidor final”, explica Jacob Benincá, gerente do condomínio.
O presidente do condomínio conta que foi preciso coragem para investir quase R$ 9 milhões. “Nós andamos muito. Fomos visitar várias obras, várias unidades de cerealistas e cooperativas. E aí fomos criando uma ideia nossa de como queríamos fazer”, explica Adyr Dazzi.
Os agricultores tiveram 90% da obra financiada com recursos de programas de crédito oficiais e de bancos privados. O espaço que cada sócio tem dentro do armazém depende da cota que foi comprada, com base no tamanho da propriedade e na produção de cada um.
Na hora de pagar as contas funciona da mesma maneira. Cada sócio responde por sua cota e o pagamento é feito em produto. “Quando entra o produto já é retido 2% de cada condômino para despesa de funcionário, compra de lenha, energia, manutenção e para pagar as ampliações”, diz Dazzi.
Os condomínios vêm dando tão certo que a ideia está se espalhando pelo município de Palotina e pelo estado do Paraná. O Agroparaíso, segundo condomínio da cidade, pertence a oito agricultores e tem capacidade para armazenar 22 mil toneladas de grãos.
O condomínio Agroparaíso ficou pronto em 2013 e custou R$ 8,2 milhões. Quase todo valor foi financiado. Antônio Galli, presidente do grupo, explica que o condomínio proporcionou outras vantagens. “A facilidade de entrega de produto, no momento mais crítico, nas empresas que a gente vendia antes encontrava filas de 5 a 6 horas que a gente tinha que ficar. Aqui não. Isso facilita muito pra gente na lavoura porque não preciso parar as colhedeiras. A gente não precisa pagar fretes, que é bastante caro na época da colheita. Com o próprio caminhão, a gente consegue trazer de quatro a seis viagens no dia. Enquanto que antes a gente fazia uma ou, no máximo, duas viagens”, aponta Galli.
Há mais vantagens para quem produz e também consome grão. Além do plantio de 250 hectares de soja e milho, na granja da família Mioto se faz a cria de 500 leitões por semana e a engorda de mais de um milhão de frangos por ano.
Leonardo Mioto explica que antes do condomínio a família produzia o milho e, como não tinha onde guardar, era obrigada a vender o grão. Depois, comprava de volta para alimentar os porcos. Hoje, toda a produção da família vai para o condomínio. A soja é vendida no mercado e o milho volta para a granja seco, selecionado e beneficiado. “De manhã você pegava uma carga de milho era um tipo de milho. No outro dia você ia buscar outra carga, podia ser no mesmo local, mas acontecia de ser diferente. Então, toda carga você tinha que ficar analisando”, diz.
Animados com o sucesso dos vizinhos, mais agricultores se organizam para formar novos condomínios. Só em Palotina já tem um espaço em construção e mais três em fase de planejamento. Para o presidente do Sindicato Rural do município, Nestor Araldi, a explicação para tanto interesse é simples.
“Quem está estabelecido e não quer sair do município, comprar terra aqui é muito caro. Não compensa mais comprar terra aqui. Então, o jeito é nós agregar valor no nosso produto. Então, invés de eu pagar para uma firma, uma cooperativa, ela limpar meu produto e secar. Eu seco e limpo e entrego para ela o produto depois”, diz Araldi.
O condomínio agrega valor porque permite que o agricultor guarde os grãos para vender quando quiser. Ao reduzir os custos e vender melhor a produção, aumenta o lucro do produto. “Vamos falar em torno de 55 sacas por hectare e um preço a R$ 55. Eu vou ter um lucro de 20%. Dentro do condomínio, eu consigo um ganho líquido em torno de 5% no produto”, calcula Galli.
Parece, mas não é pouco. Se o lucro líquido é de 20%, 5% representam aumento de um quarto, ou seja, acréscimo de 25% no dinheiro no bolso do produtor no final de cada safra.
Fonte: Globo Rural