quarta-feira, 29 de junho de 2016

Mangaba ganha repositório digital atualizado

Foto: Saulo Coelho
Especialistas lançaram a edição atualizada do ‘Sistema de Produção da Mangaba para a Região Nordeste do Brasil'. Publicado sob a coordenação técnica dos pesquisadores da Embrapa Tabuleiros Costeiros (SE) Josué Francisco da Silva Junior e Ana Lédo, o sistema é um repositório digital completo sobre a fruteira, com informações técnicas objetivas, organizadas e qualificadas, de interesse prático, sobre o seu processo produtivo.

A versão anterior do sistema havia sido lançada em 2002, com foco nos Tabuleiros Costeiros e Baixadas Litorâneas, sob a coordenação do pesquisador da Empresa de Desenvolvimento Agropecuário de Sergipe (Emdagro), Raul Dantas Vieira Neto, falecido em 2011. A Empresa Estadual de Pesquisa Agropecuária da Paraíba (Emepa) também tem gerado, ao longo dos anos, informações importantes que compõem o atual sistema de produção de mangaba para a Paraíba e o Rio Grande do Norte.

A nova versão teve a participação de alguns dos maiores especialistas do País em suas áreas de atuação e com experiência na cultura da mangaba em Sergipe, Pernambuco, Paraíba, Alagoas, Rio Grande do Norte, Bahia, Pará e na região do Cerrado, no Planalto Central do Brasil. 

"A participação direta da iniciativa privada, sobretudo na industrialização, permitiu que o sistema de produção também fosse validado pelo segmento. Com isso, a Embrapa e instituições parceiras disponibilizam informações atualizadas para a produção da fruta no Nordeste, reunindo as tecnologias geradas e adaptadas disponíveis para a cultura nessa região", explica Josué. 

Sistema

O repositório apresenta todas as informações sobre a mangaba de forma organizada e de fácil acesso e navegação para o usuário, com divisões por tópicos específicos, sempre com imagens que ajudam a ilustrar e facilitar a compreensão. 

A linguagem clara e objetiva permite que o Sistema de Produção da Mangaba atenda a qualquer pessoa que deseje iniciar o cultivo da fruta, desde pequenos agricultores a produtores de escala comercial e proprietários e técnicos de agroindústrias.

As primeiras seções trazem, além de uma introdução geral, as principais características da fruta, sua área de ocorrência, importância socioeconômica e as principais variedades, com indicações de clima e solo favoráveis ao desenvolvimento da cultura. As demais áreas têm foco em aspectos mais importantes do sistema produtivo, como adubação, produção de mudas, técnicas e parâmetros de plantio, tratos culturais, doenças e pragas. 

Em seguida, o sistema apresenta detalhes das fases de colheita e pós-colheita, com informações sobre conservação, comercialização e características de mercado, bem como processos industriais de beneficiamento da polpa.

Na parte de Coeficientes Técnicos, o usuário encontra tabelas completas que registram estimativas de custos de produção divididas por tipo de insumo e mão de obra.

"Por meio das novas técnicas de preservação e cultivos, poderemos incentivar a maneira correta de coleta e armazenamento. E também ensiná-los a preparar mudas e fazer plantações de mangabeiras", acredita o técnico ambiental, Jackson Andrade, do núcleo operacional de Mata de São João (BA) da Assessoria Técnica, Social e Ambiental do Incra, responsável por atender famílias de nove assentamentos.

A fruta

A mangabeira, de nome científico Hancornia speciosa, possui distribuição ampla, com ocorrência nos Tabuleiros Costeiros, Baixada Litorânea e Cerrados do Brasil. Seu fruto é rico em vitamina C e ferro, tem sabor marcante e encanta nativos e turistas pela variedade de produtos que se pode obter de sua polpa: geleia, licor, bombons, sorvete e suco, que deixa um duradouro visgo nos lábios.

Na medicina popular, a casca, o látex (leite do tronco), a raiz e as folhas são remédios que combatem hipertensão, diabetes, colesterol alto, úlceras e gastrite. Cantada em prosa e verso por poetas, menestréis e grupos folclóricos, a mangabeira é a árvore símbolo oficial de Sergipe, estado que registra maior índice de produção extrativista. 

Mas nem tudo é poesia quando se trata da realidade em torno da mangaba. Uma situação crescente de destruição dos recursos naturais, intensificação das indústrias imobiliária e do turismo, privatização das áreas e impedimento do acesso às plantas em locais anteriormente de entrada livre são os maiores obstáculos. Além disso, a mangaba tem sido valorizada por seu sabor marcante, tendo demanda superior à oferta.

Conhecimento

Para conhecer toda a problemática em torno da mangaba em suas áreas de ocorrência no Brasil, a Embrapa tem conduzido pesquisas com abordagens metodológicas que combinam as ciências sociais e naturais. Josué Júnior e a pesquisadora Dalva Mota, da Embrapa Amazônia Oriental (PA), têm atuado em projetos pioneiros desde 2003.

Informações aprofundadas sobre a mangabeira estão reunidas também na ‘Árvore do Conhecimento da Mangaba', publicada no repositório da Agência Embrapa de Informação Tecnológica em 2011. A Árvore do Conhecimento, também chamada de árvore hiperbólica, é uma forma de organização das informações e documentos sobre temas específicos para navegação e acesso em forma de teia hierarquizada, com visual semelhante ao da copa de uma árvore. 

Em 2016 a mangaba entrou para a galeria da Coleção Plantar, série de livros de bolso editada pela Embrapa com linguagem didática, simples e objetiva, tendo como alvo produtores rurais, proprietários de sítios e chácaras, estudantes, donas de casa e demais interessados em resultados de pesquisa testados e validados pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária.

A ex-presidente do Movimento das Catadoras de Mangaba (MCM), uma das entidades associativas dessa população tradicional em Sergipe, Patrícia de Jesus, reconhece a importância do trabalho dos pesquisadores para o fortalecimento da sua luta. "A atuação de todos tem sido fundamental para fortalecer o nosso movimento, subsidiar políticas e promover a conservação da mangabeira", afirma.

A Embrapa Tabuleiros Costeiros mantém um Banco Ativo de Germoplasma (BAG) da Mangaba em seu campo experimental de Itaporanga D'Ajuda, no litoral sergipano. Com 253 acessos (amostras de plantas em número suficiente para representar a variação genética de uma população) provenientes de oito estado brasileiros, o BAG da Mangaba foi implementado em 2006, e possui grande variabilidade genética e conserva amostras de algumas populações com enorme vulnerabilidade, por estarem situadas em áreas de intensa especulação imobiliária.

Extrativismo

Cerca de 90% da mangaba produzida no País são provenientes do extrativismo, e, por causa do desmatamento, a demanda tem sido maior do que a oferta. "A mangaba tem o preço elevado no mercado, pois não é fácil de ser encontrada em muitas regiões", relata Josué.

De acordo com Silva, há poucas áreas de plantio, e o extrativismo ocorre de modo rudimentar, sendo praticado principalmente nos estados da Bahia, Sergipe, Rio Grande do Norte e Paraíba.

O valor mercadológico crescente resulta também em aumento do conflito de interesses, tanto pelo fruto quanto pelas terras onde ele cresce. Atentos a essa valorização da fruta, donos de terras que, tradicionalmente, permitiam a entrada das catadoras, agora fecham suas cancelas e sobem suas cercas, além de derrubarem pés de mangaba para dar lugar a outras culturas, em diversas áreas de conflito em Sergipe e outros estados.

Uma ação importante realizada pela Embrapa e instituições parceiras foi o "Mapa do Extrativismo da Mangaba em Sergipe – Ameaças e Demandas", lançado em 2010. A publicação traz um diagnóstico detalhado sobre a realidade das catadoras, suas nuances sociais, econômicas, políticas e ambientais. 

A obra está sendo atualizada desde 2015, e terá nova edição até o final deste ano. Os novos dados trarão uma visão da evolução dos conflitos e problemas, auxiliando na construção de políticas públicas que favoreçam as catadoras. Uma delas é a implantação de uma reserva extrativista no litoral Sul de Sergipe, em fase de negociação entre as autoridades estaduais e federais.

Em 2012, a Embrapa lançou o livro "A Mangabeira As Catadoras O Extrativismo". Financiada com recursos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a obra traz a visão de diversos pesquisadores sobre aspectos da realidade em torno da fruta e das comunidades que garantem o sustento a partir da sua extração. Estão reunidos no livro reflexões e resultados de oito anos de estudos em comunidades de catadoras e apanhadoras do Nordeste – especialmente de Sergipe, do Norte (Pará e Tocantins) e Sudeste (Minas Gerais).


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