Grandes empresas de varejo, produtores, acadêmicos, representantes de indústrias de alimentos, governo e especialistas do terceiro setor se reuniram nesta quinta-feira para analisar os progressos da “Agricultura de Baixo Carbono e a contribuição do GHG Protocol Agrícola” – uma ferramenta desenvolvida pelo WRI, em parceria com a Embrapa e Unicamp para calcular emissões em propriedades rurais, contribuindo na transição para uma agropecuária de baixo carbono cada vez mais valorizada pelo mercado.
“O GHG Protocol Agrícola é uma ferramenta que permite tirar uma fotografia das emissões de gases de efeito estufa que a fazenda emite. E é também uma ferramenta de gestão do carbono, porque incentiva a adoção de boas práticas agrícolas. Quando o produtor faz isso, os ganhos são múltiplos. Ele reduz as emissões, aumenta a produtividade e, de quebra, ainda acessa novos mercados promissores no Brasil e no exterior”, afirma Juliana Speranza, Pesquisadora da área de Clima do WRI Brasil.
Nos projetos-piloto que já estão utilizando a ferramenta, lançada há dois anos e oferecida gratuitamente aos usuários, é possível verificar que a introdução de boas práticas como plantio direto, recuperação de pastagens e integração lavoura-pecuária-floresta aumentam a lucratividade do produtor, ao mesmo tempo em que reduzem as emissões de gases que provocam o efeito estufa.
O pesquisador da Embrapa, Eduardo Assad, que participou do desenvolvimento do GHG Protocol, acredita que o país está deixando a “lavoura solteira” para entrar em um sistema de produção que inclui integração da agricultura, pecuária e floresta e amplia o tempo de ocupação da terra para até 92% do ciclo anual, seguindo o mesmo caminho que o plantio direto teve no passado. “Temos área, tecnologia, capacidade de produção e podemos reduzir as emissões de carbono e aumentar a oferta de alimentos. Só o Brasil tem isto, por isto acredito que podemos nos tornar uma potência agroambiental”, profetiza. São valores e oportunidades que colocam o Brasil no lugar privilegiado de celeiro do mundo e maior produtor mundial de carne, contribuindo para a segurança alimentar global assentada em padrões de produção com respeito ao meio ambiente.
Dentre os compromissos assumidos pelo Brasil no Acordo do Clima de Paris quase um terço das reduções das emissões estão nas mãos do setor agropecuário: restauração de 12 milhões de hectares de florestas e recuperação de 15 milhões de hectares de pastagens, além da integração de cinco milhões de hectares em sistemas de lavoura-pecuária-floresta. A meta anunciada deverá reduzir as emissões do setor em 28%, até 2030, tendo 2005 como referência. Mas este potencial de mitigação pode ser muito maior, segundo o climatologista Carlos Nobre, membro da Academia Brasileira de Ciências e da Academia de Ciências dos Estados Unidos. Isto seria possível por meio do desmatamento zero e o fortalecimento e expansão da agricultura de baixo carbono no Brasil.
“Estamos acostumados a esperar que as soluções venham do governo e a cobrar a introdução de políticas públicas para resolver questões”, disse Nobre. “Mas o que estou vendo nesta discussão com representantes de todos os elos da cadeia de produção é uma proposta no sentido inverso. Mercado, especialistas e academia propondo mudanças que vêm debaixo para cima”.
Nobre vê dificuldades, como o baixo nível educacional da maioria dos agricultores e pecuaristas brasileiros. Capacitação do produtor e acesso a financiamento também são apontados como essenciais para o diretor de Sustentabilidade da JBS, Marcio Nappo. O problema foi contornado no Projeto Novo Campo, em que mais de 20 pequenos e médios produtores de Alta Floresta utilizam boas práticas agropecuárias e seguem o GHG Protocol para calcular a redução de suas emissões. Iniciado pelo Instituto Centro de Vida (ICV), uma ONG de Mato Grosso, o projeto é hoje monitorado pelo ICV e financiado por uma empresa privada (Pecsa). Mc Donald’s e JBS recentemente anunciaram uma parceria com a Pecsa para compra da carne sustentável produzida no Novo Campo.
“Quando falamos de tecnologia, esquecemos o ser humano. O que leva um pecuarista a se engajar em algo novo? Ele vê que o vizinho está tendo bons resultados e lucrando mais e aí recebe assistência técnica para fazer igual. O GHG é um indicador que vai dizer se todos os esforços que estão sendo feitos estão dando resultados”, diz Leonardo Lima, diretor de Sustentabilidade para a América Latina da Arcos Dorados, dona da franquia da Mc Donald’s em mais de 20 países do continente.
“O setor produtivo e as OnGs não são mais antagônicos. Chegamos a um momento em que concordamos que a intensificação da produção é a solução em potencial para aumentar a produção e reduzir as emissões do setor”, afirma Caio Penido, diretor de Novos Negócios e Sustentabilidade do Grupo Roncador, um grande empreendimento agropecuário do país. O Roncador participa de outro projeto-piloto que utiliza o GHG Protocol. O Carbono Araguaia, que está recuperando 26 mil hectares de pastagens em diferentes estágios de degradação, em 24 fazendas do município de Cocalinho, em Mato Grosso.
“O GHG Agropecuário é importante porque estabelece uma metodologia que pode ser seguida e comparada e que pode ser usada para pressionar toda a cadeia produtiva a emitir menos”, afirma Tatiana Trevisan, gerente de Sustentabilidade da rede Walmart.
O governo do Mato Grosso, que se comprometeu na COP-21 de Paris a zerar o desmatamento ilegal até 2020, tem apoiado o uso da ferramenta no estado, por meio do programa Produzir, Conservar e Incluir (PCI). Cerca de 100 produtores, representantes de entidades de classe e gestores públicos já foram treinados no uso da ferramenta, que vai ajudar na “eficiência da produção agropecuária e florestal do estado, aliada à conservação da vegetação nativa e recomposição dos passivos ambientais”, segundo o Secretário Adjunto de Agricultura do Mato Grosso, Alexandre Possobon.
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